António Marinho e Pinto, que foi eleito ontem bastonário da Ordem dos Advogados, é um ser avesso à dependência cujos passatempos são a leitura e a música.Nascido em Vila Chã do Marão (Amarante), transferiu-se aos 20 anos de idade para Coimbra, onde se fixou, com a adesão à terra adoptiva a sofrer breves hiatos devido a incursões pela Região Autónoma da Madeira, Macau e Lisboa.
A ambição de ser piloto da Força Aérea cedeu à inclinação pelo Direito, para isso tendo contribuído o olhar que, em 1969, lançou sobre a «Crise académica» de que Coimbra foi palco.
Outro episódio que lhe fez despertar a vocação pelas lides jurídicas prende-se com uma “experiência traumática” vivida no Porto, onde, ainda jovem, foi agredido pela Polícia ao intervir numa manifestação contra a guerra no Vietname.
No início de 1971, enquanto estudante universitário, foi detido pela PIDE/DGS e esteve encarcerado em Caxias. Partilhou a cela com Luís Januário (ex-director clínico do Hospital Pediátrico de Coimbra), numa ocasião em que também estiveram presos, entre outros, Rodrigo Santiago, Carlos Fraião, Domingos Lopes, Jorge Seabra e Pena dos Reis (actualmente magistrado do Ministério Público).
Aderiu à UEC (União dos Estudantes Comunistas), no princípio dos anos 70 [do século XX], numa fase em que aquela organização política de juventude estava a ser fundada, e participou no Congresso da Oposição Democrática (realizado em Aveiro).
Em Março de 1973 tornou-se membro da Comissão pró-reabertura da Associação Académica de Coimbra (AAC) e, ainda antes de 25 de Abril de 1974, desvinculou-se da UEC, por sentir que lhe faltava “idiossincrasia para agir segundo verdades que outros propalavam”. O “permanente desejo de questionar as coisas” pô-lo em “rota de colisão com dogmas do marxismo-leninismo”, explica o jurista.
Ingressou no jornalismo através da então Agência Noticiosa Portuguesa (ANOP) e chefiou a respectiva Delegação na Região Autónoma da Madeira entre finais de 1979 e de 1980.
A “paixão pela verdade” impediu-o de “ocultar certas coisas” que, em seu entender, tinham de ser noticiadas, tendo regressado a Coimbra, volvido um ano, por decisão da antiga agência noticiosa de capital exclusivamente público.
Em meados da década de 80, fundou um jornal vocacionado para o meio académico, A Tribuna de Coimbra, semanário concebido para “dar eco a factos e opiniões que ficariam sem expressão pública”. Os jornalistas Eduardo Dâmaso e Luís Costa ajudaram António Marinho a dar corpo ao projecto durante cerca de um ano.
No final de 1987 o jornalista e jurista desvinculou-se da Lusa (agência noticiosa que resultou da fusão da ANOP e NP - Notícias de Portugal) para assessorar um secretário adjunto do Governo de Macau, tendo permanecido pouco tempo no Oriente.
De regresso a Portugal, fez uma curta incursão por Lisboa, mas o apelo de Coimbra soou mais alto.
Para além de albergar “a melhor Escola de Direito de Portugal”, Coimbra, diz ele, possui “sortilégios secretos muito intensos, capazes de fascinar as pessoas”.
O ambiente das tertúlias desde sempre cativou o antigo presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados (OA), função que o causídico deixou a meio do mandato devido a divergências com o então bastonário José Miguel Júdice.
António Marinho empolga-se com um bom debate sobre questões culturais, políticas ou filosóficas, delicia-se a ouvir música e é apreciador de um bom vinho, limitando-se, hoje em dia, a consumir um ou outro charuto “da mesma forma que Bill Clinton fumava liamba – sem inalar – quando era estudante”.
“Se me sinto dependente de alguma coisa, passo mal”, assinala o causídico ao definir-se, com ironia, como um “toxico-independente, cujo dia-a-dia se desenrola à margem de quaisquer drogas” (ainda que fossem álcool ou tabaco). “Bebo com moderação e por prazer”, confessa.
O professor universitário Faria Costa gaba-lhe a “coragem cívica” e alude a uma “força impetuosa” capaz de lhe conferir “um grão de diferença”.
“Quer enquanto advogado, quer enquanto cidadão, sempre julguei António Marinho como um sujeito atavicamente mal comportado, ou seja, predisposto, sempre, a «pegar de caras» a prepotência e a mediocridade instaladas; subversivo sempre, mas sub-ser-vivo nunca”, diz João Ferreira Moura (causídico portuense).
A aspiração a liderar a OA define-a como “uma etapa de um combate pela Justiça, pela advocacia e pela cidadania”.
Ao admitir que possui uma “relação conflituosa com a culinária e outra amistosa com a gastronomia”, confessa que mesmo os ovos supostamente estrelados acabam por se assemelhar aos mexidos.
Os hábitos de trabalho (madrugadores) fazem com que esteja de pé pelas 05h00, altura em que começa a interessar-se pela actualidade noticiosa, e a comodidade inerente à “ausência de constrangimento abdominal” leva-o a preferir suspensórios em detrimento do cinto.
Sem comentários:
Enviar um comentário